Há um bom tempo deixo os amigos brasileiros cansados de tanto falar da beleza de Avignon. Um deles, a querida Anatê, me pediu para colocar essa paixão e conhecimento pela Cité des Papes no papel e assim dividir com os leitores do site dela os segredos de Avignon. Esse dia finalmente chegou! Entre o rio Rhones e uma rocha – Rochers des Doms – Avignon existe desde a época dos celtas. A cidade teve uma história movimentada oscilando entre independência e feudalismo. No século XII, ela era uma cidade cosmopolita que atraia estudantes, comerciantes e homens de letras vindos de vários horizontes. O dinheiro que circulava em Avignon fez dela uma cidade importante entre a Itália, a França e a Espanha.
Hoje, você só precisa ver de longe a cidade para imaginar o impacto dela no passado. Reconhecida pela UNESCO como patrimônio mundial da Humanidade, a cidade medieval oferece um cenário de outra época: a muralha de calcário deixa aparecer os campanários de várias igrejas e, no fundo, a estátua dourada da Virgem domina a cidade no alto da catedral romana. O Palácio dos Papas, de estilo gótico, impõe a sua presença pelas duas torres do portão de entrada e a ponte que se estende da muralha até o rio mostra até que ponto o homem chegou a dominar a natureza. Mas o fato da ponte ter sido destruída três vezes lembra que o rio Rhône sempre foi mais forte que os avignonenses. Mas se o rio foi um adversário que transformou a ponte em lenda, Avignon ficou conhecida por que durante muito tempo foi um Estado dentro da própria França. Do século XIII ao século XIV, Avignon passou a pertencer ao Vaticano e ficou sob a autoridade do Papa até 1791, ano em que o povo “pediu” com armas para voltar a ser francês.
Passeando pela cidade você pode descobrir esta história extensa e rica. A Place de l’Horloge, hoje a praça principal, é um vestígio do antigo “oppidum romano” (basta descer a rua para descobrir o que ainda resta do oppidum, como são chamadas as escavações arqueológicas por aqui). Cada capela, cada igreja corresponde à uma ordem religiosa diferente, atestando o número de religiosos que gravitaram ao redor do Papa tentando exercer alguma influência. A praça que se estende na frente do Palácio, edificado em duas partes, é a maior praça medieval da Europa. O Palácio dos Papas é um monumento arquitetônico muito similar ao Mont Saint Michel embora isso pareça improvável. Opte pela visita que permite descobrir os tetos do Palácio e a vista estratégica do lugar. Só não fique decepcionado: o palácio está vazio! Naquela época os nobres, reis e papas tinham costumes de viajar com todas os pertences, mobília incluída. Ao lado do Palácio, você pode admirar a antiga casa dos arcebispos hoje transformada em museu que apresenta uma linda coleção de pinturas religiosas. Recomendo muito.
Cada rua, cada praçinha exprime essa época medieval e crescer ali foi maravilhoso. O meu colégio era uma antigo convento, igual ao colégio rival que ficava do outro lado da cidade. A biblioteca: o antigo palácio de um cardinal. As minhas tardes de adolescência se perderam na grama do jardim des Doms perto da Catedral ou nos terraços dos cafés da Place de l’Horloge.
Hoje, volto para Avignon sempre que posso. E é melhor não contar para a minha família, mas volto tanto para eles quanto para a cidade.
Adoro descobrir de novo os encantos dela e no verão tem essa agitação que só existe por aqui: desde 1947 Avignon é sede do maior festival de teatro do mundo. Parece presunçoso, mas é verdade. Criado por Jean Vilar, ator francês que você pode descobrir em alguns filmes de Jean Cocteau, o festival tinha como objetivo fazer do teatro uma arte popular, promovendo obras a um preço razoável. Hoje, estamos um pouco longe disso e até tem dois festivais: o “in” que é o oficial e onde vemos obras para iniciados, com um alto preço e o “off” que é uma muvuca impressionante. Neste ano, por exemplo, são mais de 1200 peças que estão sendo apresentadas durante as três semanas do festival. Aqui as companhias de teatro do mundo inteiro chegam com uma ansiedade grande: podem ganhar ou perder tudo, porque é esse é o maior “mercado” teatral francês e europeu. Os diretores dos maiores teatros vêm escolher a futura programação dentro das obras apresentadas. Mas além desta realidade dura, o que prevalece é a energia do festival. É fantástica! A cidade enche, canta, dança, e tudo no ritmo do mistral, esse vento forte vindo do Norte e que deixa os estrangeiros com dor de cabeça.
Claro, tem quem não gosta desta agitação e, para falar verdade metade dos avignonenses fogem de Avignon durante o festival. Parece um pouco estranho mas é assim. O segredo é esse: nós não gostamos de dividir a nossa cidade, mas mesmo assim nos sentirmos privilegiados! Um último conselho: quem quer curtir a cidade com mais calma venha entre maio e setembro.“
Texto: Amandine Marc.
4 Replies to “Avignon: contada por Amandine Marc, amiga que nasceu e viveu na cidade”
1 junho 2013
1 junho 2013
1 dezembro 2013
4 dezembro 2013